ATINJ

A ATINJ tem por objectivo defender os legitimos interesses das Estruturas Associadas, dignificar e desenvolver a actividade artística e intervir nas questões que se prendam com o trabalho cultural vocacionado para a infância e juventude, desenvolver acções de formação artística e técnica, promover encontros e intercâmbios com outras organizações congeneres a nível nacional e internacional.

terça-feira, novembro 29, 2005

Apreciação sobre o projecto de Decreto-Lei que visa proceder à alteração do Regime da concessão de apoios pontuais no âmbito do Instituto das Artes.

Olá amigos, afinal o Decreto-Lei que visa proceder à alteração do Regime da concessão de apoios pontuais no âmbito do Instituto das Artes ainda não foi aprovado (ligámos para o MC e para o IA e disseram que ainda não tinha sido aprovado) e pedimos à nossa advogada que nos escrevesse um parecer a enviar para Presidente da República, Primeiro Ministro, Ministério da Cultura, Grupos Parlamentares e Imprensa. E assim escrevemos o seguinte:

1. Pode ler-se no preâmbulo do presente projecto que tal alteração visa:

“ simplificar e tornar mais céleres os procedimentos de apresentação e apreciação dos projectos,
garantir a constituição de comissões de apreciação competentes e informadas, compostas por reputados especialistas nas respectivas áreas artísticas e assegurar a consistência e a transparência de critérios na avaliação e selecção dos projectos, bem como na definição dos montantes a atribuir.”

2. Partindo desses pressupostos analisemos então o conjunto de alterações proposto, tal como consta do projecto em causa.

3. As alterações constantes dos números 3, 5 e 6 do artigo 11º, surgem, presumivelmente, com o intuito de implementar a referida simplificação e celeridade de apreciação dos projectos.

4. Contudo, urge proceder à análise do conteúdo de tais inovações.

5. Senão vejamos, a letra do projecto, no respeitante ao Artigo 11º, sob a epígrafe Apreciação dos Projectos:

5.1.“3 . O procedimento de apreciação das propostas é urgente e de interesse público não havendo lugar a audiência de interessados.”

Tal comando é violador de um direito essencial dos administrados, a saber o de serem ouvidos acerca da eventual decisão que afecte os seus direitos e interesses.

Na verdade, o princípio do contraditório, é uma manifestação da garantia dos princípios democráticos, pois consagra a oportunidade de defesa dos particulares quanto a decisões que os possam lesar.

Tal desiderato é prosseguido no Código de Procedimento Administrativo, maxime nos artigos 100º e seguintes.

Com efeito, a regra geral de direito administrativo contida no artº 100º do CPA, postula que tal norma é aplicável a todos os procedimentos administrativos.

E, assim deverá ser quanto a este procedimento administrativo concursal, pois não pode ser visto como um concurso de natureza diferenciada de todos os outros.

A natureza do presente concurso não pode ser equiparada a qualquer outra previsão geral e abstracta que tenha determinado para qualquer concurso a preterição de tal formalismo essencial.

Na verdade, a lei consagrou a possibilidade de recurso à figura da inexistência e dispensa de audiência de interessados, tal como consta das várias hipóteses elencadas no artigo 103º do CPA.

Contudo, esse regime é excepcional e casuístico, devendo ser fundamentado em concordância com a situação em concreto.

Não é de modo algum admissível que da excepção se faça lei, mais a mais revogando este um princípio de direito que garante a boa-fé, a igualdade, a transparência e sobretudo a justiça.

A natureza do concurso em causa, não oferece fundamentos bastantes para se entender que deva ser suprida, sem mais, a fase da audição dos interessados.

Com efeito, os prazos com que se vão realizando as variadíssimas reuniões de júri, não se encontrando sujeitos a quaisquer regras permitem que se vá estendendo no tempo o concurso.

No entanto, tal metodologia, não pode querer ultrapassar uma última fase do concurso, lesando os direitos e interesses dos participantes, como método para obstar à morosidade criada daquela forma.

A nosso ver o que deveria ocorrer em sede de alterações seria, sim, criar prazos obrigatórios para os membros do júri se pronunciarem nas diversas fase de apreciação, decorrendo sanções em caso de incumprimento, de nível pessoal, as quais seriam agravadas em caso de reincidência.

Não se pode querer extinguir um direito essencial aos concorrentes, quando do lado dos instrutores não se criaram mecanismos que obstem à morosidade dos procedimentos, que nos vêm habituando a autoridade administrativa.

Na verdade, tal método é violador também do princípio da igualdade e proporcionalidade, pois faz recair um sacrifício sobre os particulares, sem que do lado da administração haja um esforço no sentido de criar condições capazes de garantir o cumprimento de um direito fundamental.

Nesta conformidade, só podemos discordar de tal entendimento, violador dos direitos e garantias dos administrados, repudiando tal ideia, a qual contraria clara e inexplicavelmente a tramitação exemplar dos procedimentos administrativos.

Quanto ao nº 5 do artº 11º, a nossa apreciação vai no sentido da sua desnecessidade, pois a moderna concepção quanto aos meios de auto-tutela administrativa já não dicotomiza os recursos em necessários e facultativos.

Com efeito, o conceito de lesividade do acto tem hoje uma ampla protecção a qual se projecta no novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos [1], com o qual deverá ser conjugada a presente apreciação.

Verifica-se um alargamento na protecção dos direitos e interesses legalmente protegidos, podendo recorrer-se aos Tribunais mesmo na hipótese de provável emissão de um acto lesivo (cfr. artº 37º do CPTA).

Perante este enquadramento, julga-se que a negação ao efeito suspensivo que refere tal norma é perfeitamente desnecessária, pois a interpretação actualística, à luz do referido CPTA, dos artº 163º e ss, dá desde logo por adquirida essa mesma realidade.

Uma última nota, se com esta novidade se visa impedir a eficácia do nº 4 do artº 59º do CPTA, ou seja que os meios de impugnação graciosa ou administrativa suspendam os prazos de impugnação contenciosa, já nos parece que a introdução seja de afastar totalmente, pois seria completamente perverso e atentatório dos direitos e interesses dos particulares.

Já quanto ao nº 6 do artº 11º, teremos de protestar veementemente com a sua introdução, pois a sua nulidade gritante deveria impedir o legislador de sequer a projectar.

Veja-se a redacção: “A propositura da providência cautelar e suspensão da eficácia de um acto administrativo praticado no procedimento não tem por efeito a proibição da execução desse acto.”

Trata-se de situação que colide com o princípio oitocentista da separação de poderes, o qual se mostra consagrado no artº 111º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e plasmado no artº 3º do CPTA.

Na verdade, os artºs 112º e ss do CPTA regulam as Providências cautelares, visam garantir o efeito útil das decisões, sendo exactamente um dos comandos o de obter a suspensão da eficácia de um acto administrativo, constando, a propósito, do artº 128º a proibição de executar o acto administrativo.

O próprio legislador previu a possibilidade de a autoridade administrativa, poder, mediante resolução fundamentada, reconhecer, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público e assim, suspender o efeito suspensivo da providência cautelar.

Assim sendo, nem sequer a perspectiva segundo a qual se trata de lei especial que afasta a aplicação da lei geral é hipótese admissível.

Permitir a adulteração do espírito do sistema é abrir um precedente que coloca em causa a própria organização do Estado.

A hipótese de afastar a suspensão da execução do acto encontra-se assegurada pelo recurso à figura da resolução fundamentada e assim deve ser concretizada..
[1] Aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22.02, doravante designado por CPTA.

terça-feira, novembro 22, 2005

Teatro para jovens públicos


" A expressão «teatro para crianças» não tem qualquer significado de carácter estético. Do mesmo modo que a expressão «teatro popular», ilustrada por Jean Vilar, designa um público e não um género teatral diferente. "Teatro para crianças" quer dizer jovens espectadores face ao teatro. É tão simples como isto... e é extremamente complexo, uma vez que se trata, em primeiro lugar, de teatro"

Maurice Yendt, Les ravisseurs d' enfants, Editions Actes-Sud-Papiers

Teatro para Infância em Portugal - AQUI/AGORA

Poderá a Liberdade Artística ser assumida verdadeiramente? Se a ajuda financeira a uma criação para a infância e juventude é sempre oficialmente inferior a uma criação para o público adulto?

Poucas companhias podem realmente cobrir as despesas de uma criação, o que talvez desvirtue os seus objectivos estéticos e artísticos, e as obrigue a fazer “o que se pode”.

A obrigação de um certo número de espectáculos, agora uma das condições de acesso aos subsídios do estado empurra-nos para a venda de espectáculos a baixo preço e em locais raramente com condições teatrais ideais (escolas, museus, etc.), e que além de privarem o público infantil da ida a um teatro e o jogo social que este proporciona, diminui a qualidade dos espectáculos.

Além das condições económicas, talvez seja necessário reflectir sobre as limitações temáticas, sempre diminuídas pelas questões técnicas: poucos actores, pouca ou nenhuma cenografia, montagem mínima, ou o recurso a temas escolarizados para se conseguir vender. Assim, a liberdade de criação terá de ser sempre vigiada.

As companhias têm que resolver sozinhas os problemas de difusão, colocação, venda, procura de um público para os seus espectáculos antes mesmo de se preocuparem com o processo de criação.

Neste momento um espectáculo com um texto e uma dramaturgia exigente provoca medo aos compradores e programadores. A moda do teatro de misturas: vídeo, dança, circo, etc., é o que está em moda e portanto obriga-nos muitas vezes a submetermos às expectativas dos programadores tornando o nosso trabalho apenas um objecto “vendável”.

O que é de lamentar é que os autênticos criadores de espectáculos para a infância e juventude sejam substituídos por fabricantes de espectáculos que são cada vez mais uma distracção, ou servem meramente os objectivos escolarizados.

Sabemos que o lugar da infância na nossa sociedade é problemático. Como aceitar que as crianças, verdadeiramente uma grande parte do público teatral no nosso país, sejam tão pouco consideradas e que o Estado não lhes consagre a parte exacta a nível financeiro, argumentando sem nenhuma vergonha que há pouca qualidade artística neste sector, argumento este que o mesmo estado alimenta com a penúria de subsídios e um desprezo profundo pelos direitos das crianças.

Mas o que fazer?

Talvez a primeira acção seja romper com o isolamento em que nos encontramos.

Respeitar as diferenças de formas e objectivos de cada grupo e hierarquizá-los.

Fomentar encontros entre criadores deste sector do teatro, co-produções, feiras de teatro e momentos de debate.

Exigir ao poder actual uma verdadeira política teatral para a Infância e Juventude, que assegure uma resposta adequada às necessidades do “agora” e prepare o público de amanhã para uma maior abertura estética e social assim como para um maior poder de crítica e de exigência artística.
José Caldas